Rafael Braga
É fato que a internet é ferramenta vital e base tecnológica para o micronacionalismo tal qual conhecemos hoje. Não fossem os e-mails, certamente não poderíamos ter micronações com número razoável de cidadãos, muito menos contando com gente de todo o Brasil e até de todo o mundo. Não podemos negar a importância da internet, porém, não podemos limitar nossa experiência micronacional ou nos tornar escravos dela.
Essa natureza tecnológica do micronacionalismo atual muitas vezes faz com que as pessoas confundam alguns conceitos ou vejam de forma equivocada o sentido de toda essa confusão que vivemos diariamente como parte integrante de nossas vidas. Essa mesma natureza tecnológica faz com que convivam, nem sempre harmoniosamente, leigos assumidos com especialistas na área de informática.
Essa semana me chamou a atenção, mais uma vez, a questão da mudança da Lista Nacional para o googlegroups, com suas defesas entusiasmadas, quando uma voz se levanta novamente, era Francisco Russo: Existe capacidade de armazenamento no googlegroups? É excelente o serviço, realmente não muda nada, mas... Alô? Alguém está um pouquinho preocupado com nossa história, nosso cotidiano?
Os "tecnófilos", como me convencionei a chamar, são extremamente práticos e racionais, é lógico, não poderiam ser diferentes. Estão antenados e adaptados a qualquer tipo de veículo de informação da internet, pois dominam e buscam sempre as mais modernas e avançadas tecnologias de comunicação. Por isso, têm a tendência de julgar que a tecnologia está acima das tradições: Se algo é melhor do ponto de vista tecnológico então deve ser implantado.
Digo têm a tendência porque nem todos os especialistas em informática são assim.
Só que o micronacionalismo não é uma lista de discussão, um site, uma comunidade do Orkut. A graça está na sensação que temos de viver uma realidade paralela, uma simulação de País. Os "tecnófilos" acham que a Lista Nacional deveria se tornar um fórum, tudo bem organizado, com tópicos bem definidos, cada um só lê e responde o que lhe interessa, com histórico bem guardado, analítico, quadrado e perfeito.
É normal que pensem assim, afinal de contas, como seria buscar informações sobre seus softwares e hardwares se não fosse através de um fórum? Não sei como é isso, mas imagino que deve ficar meio complicado: Tópicos misturados, uns respondendo as dúvidas dos outros, assuntos se misturando, daqui a pouco você nem sabe mais sobre qual sistema estão falando. Impossível. Só que o caos que deve ser evitado numa discussão técnica é o caos que necessariamente tem que estar presente em uma simulação social.
A micronação vive do caos, assim como a realidade. Se quisermos simular um País não podemos, de forma alguma, abrir mão da presença do caos. Ou algum de nós, por acaso, recebe diariamente apenas as informações que quer, como num fórum organizado? Somos bombardeados a todo o momento com informação, seja ela boa ou ruim, desejada ou indesejada e olha que por aqui ainda tem a tecla delete pra nos ajudar. Agimos, reagimos, e vivemos de acordo com o dia, de acordo com a hora, de acordo com o desaforo que ouvimos há dois minutos atas, com nossos sentimentos naquele segundo.
Por mais estranho que possa parecer aos "Tecnófilos", não existem tópicos na Lista Nacional: Os assuntos são complexos, interligados, inter-relacionados, são manipuláveis e perecíveis ao tempo, são vivos como um diálogo na praça, no elevador ou no ponto de ônibus. Nosso dia-a-dia não é estático como um fórum: É dinâmico como a vida, caótico como nossas cidades, imprevisível e volátil como em qualquer sociedade humana.
Retirar isso de nossa simulação é negar que o tempo tem influência sobre as pessoas, que duas mensagens que aparentemente não tenham ligação possam influenciar uma terceira (alguém assistiu "Efeito Borboleta"?), enfim, é fazer isso aqui ficar muito mais chato do que já está ficando. É essa loucura que chamamos de cotidiano, cuja existência é a essência e razão de ser do micronacionalismo.
Por isso que serei, a princípio, serei voz dissonante quando o modismo (ou o pragmatismo) volta e meia ronda a Lista Nacional. O pragmatismo acaba com o micronacionalismo: Com todo o respeito, vão ser tentar ser pragmáticos em suas vidas (é possível?)! Isso aqui é um lugar para sonhadores.
Rafael Braga
é Diplomata Nível 1
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